O que a televisão fez para a Maísa?
Precisamos cuidar para que as nossas crianças possam ter o direito de serem apenas crianças,
por Lícia Egger Moellwald, publicado no sítio ig.com.br em 23.05.09.
Você é capaz de lembrar o que fazia aos seis anos? Se a sua vida era dormir, ir para escolinha e brincar, sua infância foi saudável, normal e talvez monótona se comparada com a da menina Maísa.
Prodígio e cheia de respostas engraçadas, a bonitinha estrela do programa de domingo do SBT tornou-se uma reedição pós-moderna da sensação mirim de Hollywood, Shirley Temple, ganhadora de um Oscar especial aos seis anos de idade em 1935.
A semelhança com a atriz chega a tal ponto que a menininha repetiu várias vezes no ar quando fala com o apresentador Silvio Santos "É você que acha que eu sou parecida com a Shirley Temple".
Deliciosamente irreverente, a pequena prodígio brasileira reproduzia na tela da TV, até dois sábados atrás, o sabor da infância levada e ao mesmo tempo inocente.
A menininha é tão incrível que, nas suas aparições, o espectador chegava de fato a esquecer o que é apropriado para uma criança desta idade. Fruto da exacerbação dos interesses de consumo, Maísa tornou-se aos poucos o exemplo da loucura do poder, da ambição e da falta de parâmetros quando o assunto é a exploração humana.
Pequena e frágil, a pequena precisou chorar em cena, com medo de um menino fantasiado de monstro, para expor a inadequação do seu personagem à realidade da idade e as várias formas de exploração do trabalho infantil.
Porque a menina vem chorando nas suas apresentações ainda ninguém sabe, mas o Conselho Estadual dos direitos da criança e do adolescente de São Paulo finalmente resolveu agir e investigar se a pequena vem sofrendo pressão para se apresentar.
Na minha humilde opinião, o choro da criança pode ser de sono, cansaço, insegurança e até mesmo de solidão. Presa ao palco como um animalzinho num picadeiro de circo, sob os olhares de milhares de pessoas, Maísa pode estar chorando pela sua condição de objeto de entretenimento, mas ainda ninguém sabe.
Mas o choro da menina serve de alerta para todos os pais que levam seus pequenos filhos à exaustão pelo excesso de atividades, muitos na esperança de superar, no futuro, o que ainda não conseguiram alcançar.
O fato é que precisamos cuidar para que as nossas crianças possam ter o direito de serem apenas crianças e quando tiverem medo, sono ou tristeza, sentirem-se amparadas e ajudadas. Afinal, a infância é decisiva no processo do crescimento e por isso é preciso vivê-la bem.
Para a pobre Maísa, fica a torcida para que, se for decidida a sua continuidade na TV ela venha, como Shirley Temple, a ter uma belíssima carreira como diplomata e embaixatriz – ou simplesmente que a lucidez supere a loucura e a deixem viver sua infância em paz.
Ao ler este texto, percebi mais uma razão para pôr limites... nos pais!
Sergio Batista
-